Fala Geraldinho
1
Quando tento escrever
Peço minha proteção
Ao senhor deus dos poetas
Conforta meu coração
Ilumine minha mente
Para pensar com emoção
2
Meu amigo Asséde Paiva
Pediu com delicadeza
Pra que eu contasse em versos
Usando minha proeza
Um pouco do senhor Acir
Eu aceitei com certeza
3
Do companheiro Asséde
Acir será bem lembrado
No apê nove zero dois
Era muito bem chegado
Essa perda imensurável
O deixou balanceado
4
E Acir era generoso
Verdade não se encobre
Amigo de toda hora
Tinha um coração nobre
Ajudava muita gente
Principalmente o pobre
5
Antônio nosso porteiro
De um óculo precisava
Tava com receita médica
Mas o salário não dava
Acir pagou pelos óculos
Para o Antônio doava |
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6
Foi bom amigo um esteio
Da família cuidadoso
Se alguém adoecia
Punha-se à frente bondoso
Pagava dívida de uns
Pra todos atencioso
7
Foi um filho exemplar
Um irmão sempre presente
Cuidando de todos eles
Estando perto ou ausente
Todos unindo a conselho
Ele era muito diligente
8
Conduzia o seu clã
Com liderança maneira
E também era descendente
Do comendador Ferreira
Um homem de honraria
Em Bananal na fronteira
9
Theresa telefonava
Acode aqui meu irmão
E Acir pegava o carro
Ia veloz na direção
Levava pro hospital
Primeiro da região
Fala Asséde
10
Vou contar alguma coisa
Que não me sai da memória
Analisando meus textos
Revendo nossa história
Acir em bom português
Alcançava a vitória |
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11
Era amante das letras
Revisava meu trabalho
Debulhava português
Como cartas dum baralho
Percorrendo as estradas
Não gostava de atalho
12
Ao terminar novo texto
Pedia-lhe revisão
Tinha opinião sincera
Erros não escapam não
E quando me devolvia
Era cheio de xis a mão
13
Pois ele sabia de tudo
A tal de ortografia
E corrigia as palavras
Sentindo a eufonia
E me dizia sorrindo
Eu vejo eurritmia
Falou Acir
14
Tu queres ser beletrista
Escreva com o sinônimo
E se tiver que rimar
Aí então use um parônimo
Com este ensinamento
Autor não fica anônimo
15
Ponha vírgula e dois pontos
E a tal interrogação
Faltam aqui ali além
Aspas e exclamação
Colchetes barras parêntesis
Asterisco travessão |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
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16
Se às vezes discordávamos
Sem sair de um lugar
Consultemos o Aurélio
Pai-dos-burros vai falar
Tira-teima nossas dúvidas
Voltamos dialogar
17
Maiúscula letra rara
A use com muito respeito
Minúscula o tempo todo
Ainda em frase de efeito
Se for caso ressaltar
Use o itálico perfeito
18
Falta aqui um circunflexo
Ali um acento agudo
O verbo e o sujeito
Devem concordar, contudo
Este grave não existe
Degole já o papudo
19
E cuidado com a crase
Ela é casca de banana
Onde tem escorregado
Muito professor bacana
Se você a usar direito
Vencerá qualquer gincana
20
Olha as reticências aí
Três pontos fadigosos
Que deixam algo no ar
Pra leitores cuidadosos
Difíceis de decifrar
Pois são misteriosos |
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21
Cuidado com o hífen
Que indica união
Ele é escorregadio
E finge de travessão
Que tem dobro do tamanho
Indica separação
22
O infinito pessoal
Que coisa dificultosa
Eu o aplico mais ou menos
Quem discorde faça glosa
O nosso idiotismo
Tá com tudo não tá prosa
Fala Asséde
23
Pra provar que o amigo
Faz uma falta danada
Tudo isto foi escrito
Quase sem ponto sem nada
Se ele quiser desça cá
Faz correção adequada
24
Acir e Roberto Sanches
Comigo em parceria
Auto de Natal criamos
Bonito sem correria
Foi um trabalho perfeito
Que peça que galhardia
25
Acir criança mostrou
A marca de oratório
E mestre em português
Poeta com repertório
Do professor indicado
Orador do auditório |
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Fala Geraldinho
26
E assim era o Acir
Homem de bom coração
Já foi músico seresteiro
Tocador de violão
Com bela voz afinada
Ele cantava emoção
27
Quando abria o gogó
Parecia se transformar
A feição modificava
Ele tomava outro ar
Ao terminar a canção
Retomava seu lugar
28
E dizia com sentimento
Não posso cantar mais não
Perdi o timbre da voz
Nem toco mais violão
Nas cordas do instrumento
Meus dedos triscam em vão
29
E também era teatrólogo
Sem dúvida, muito bom
E mostrou grande talento
Em Um rastro de batom
Foi premiado no Rio
Diziam este tem dom
30
Cine Nove de Abril
Onde tudo aconteceu
Com Judas no Tribunal
Defensor escafedeu
Então o espectador Acir
Assumiu e o defendeu |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
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31
Falou com tal veemência
E tinha mortal palor
Disse o crime é atroz
Contudo Deus é amor
Iscariotes absolvido
Pela defesa com ardor
32
Pois nenhum deles sabia
No auditório lotado
Que o Homem de Nazaré
Deu a todos um recado
O perdão dos pecadores
Como pediu ao Pai amado
33
E o juiz tão encantado
Quem és tu ó defensor
Eu sou o Paráclito
Ou Jesus o salvador
O Verbo que se fez carne
Pra trazer paz e amor
34
Tá Preso por ter cachorro
Preso por não ter cachorro
Encenado no Umuarama
Recebeu aplauso em jorro
Ele escreveu e participou
Era o artista com o gorro
35
Seqüestro das cebolinhas
No Gacemss apresentado
Na primeira tentativa
Deste trabalho encarnado
Foi aplaudido de pé
Um sucesso alcançado |
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36
Acir era muito crítico
E também contestador
Do golpe em meia quatro
Foi um desafiador
Somente não foi preso
Por aviso do professor
37
Culpado foi dom Waldyr
De sobrenome Calheiro
Com os direitos humanos
Deu para ser fogueteiro
Mas Acir só foi cantar
E se meteu num vespeiro
38
Asséde Acir e Roberto
Saíram numa tardinha
Para passear e conhecer
Uma tal de fazendinha
Se realmente era fazenda
Ou uma cidadezinha
39
Pararam na portaria
Pra pedir informação
E eu fui bem educado
Senhores não vão lá não
É um pouco complicado
Enfrentar aquele chão
40
O lugar é pros senhores
Muito inconveniente
Bandidos lá andam soltos
Como cobra ou serpente
Matam os seres humanos
Como se não fossem gente |
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41
Eu disse podem parar
Vão pra lugar recatado
Ou voltem lá para cima
Pra conversar sossegado
No apê do senhor Asséde
Tudo está arranjado
42
E eles voltaram atrás
Não queriam ser rescaldo
Olhe o que iam fazer
Se não fosse eu Geraldo
Se eles fossem até lá
Beberiam o seu caldo
Fala Asséde
43
Na Siderúrgica Nacional
Onde Acir trabalhou
Na Cecisa e na Cobrapi
Por estas empresas passou
Só não foi para Dupont
Porque Itacy não deixou
44
Ela gostava tanto dele
E nele levava fé
E disse você não sai
Nem que lhe segure o pé
Vou arranjar um lugar
Pra mostrar quem você é
45
Acir na siderúrgica
Destacou dos funcionários
Fez muitos companheiros
Com amigos operários
Sempre dizia estudem
Para ganhar bons salários |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
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46
Foi exemplo na CSN
Duas vezes foi fichado
Embora a siderúrgica
Recuse ex-empregado
Ele foi exceção à regra
Homem probo e honrado
47
Pois é assim conseguiu
A ser readmitido
Porque a empresa viu
Seu valor reconhecido
Voltou pro mesmo lugar
De onde havia saído
48
Então ele voltou pro DOT
Pessoal selecionado
Pois era a nata da empresa
Trabalho organizado
Ele fazia organograma
E com boa letra traçado
49
Desenhava fluxogramas
Rotina procedimento
Burocracia sem vez
Pois reduzia o tempo
Falava este sistema
É um simples movimento
50
Na descrição do trabalho
Salário e função
E pesquisa de mercado
Viagem reunião
Em tudo participava
E dava opinião
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51
Nas confraternizações
Figura imprescindível
E era sempre intimado
Apresentar show de nível
Pois tinha voz de barítono
E por todos era audível
52
Saudades daquele tempo
Que imensa nostalgia
Nas casas de uns e outros
O grupo se reunia
Bebiam comiam riam
Em completa harmonia
Fala Geraldinho
53
Ele cansou da siderúrgica
Pediu pra se demitir
Trabalhar numa empresa
Em Barra do Piraí
Era sempre muito livre
Serenatas ir e vir
54
Ele entendia de tudo
Nunca ficava pra trás
Fez concurso e passou
E disse sou bem capaz
De ser um fiscal de renda
No estado de Goiás
55
Passou entre os primeiros
Muito bem classificado
Não o admitiram porquê
O concurso foi anulado
Tinham melado a prova
E ele foi prejudicado |
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56
Mudou-se pra Santanésia
Fabricou papel de cor
Ativo e considerado
Pelo seu empregador
E treinava todo mundo
Era bom supervisor
Fala Asséde
57
E Acir ficou na CSN
Até se aposentar
Agora descansaria
Sem precisar trabalhar
Foi aí que recomeçamos
Novamente encontrar
58
Ele vinha em minha casa
Tomar café almoçar
Saborear um bom vinho
E também tagarelar
Eu passava em sua casa
Quando ia caminhar
59
Éramos dois bons amigos
E mais do que dois irmãos
Sempre nos comunicando
Com fala de antemão
Qualquer acontecimento
Nos punha de prontidão
60
A minha esposa Cecy
E meu filho Assedinho
Gostavam muito de Acir
E o tratavam com mimo
Quando vinha a nossa casa
Pra tomar o cafezinho |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
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61
Três dias antes da morte
Olhem bem o sucedido
Meu filho ouviu no radio
Que Acir tinha morrido
Meu filho assustou muito
Deste fato ocorrido
62
Ligou para mãe Cecy
E foi lhe recomendando
Vê como conta pro pai
A nota foi lhe passando
Mas eu já tinha saído
E estava caminhando
63
Cecy muito assustada
Ligou pra casa de Acir
Pra confirmar o enterro
Que lugar devia ir
Mas para sua surpresa
Atendeu o irmão Adir
64
Riram muito do engano
De fato tinham que rir
Quem havia falecido
Era um xará de Acir
Foi bom ela ter ligado
Pra saber e conferir
65
Contudo dia seguinte
Acir nos apareceu
Contou tintim por tintim
Como foi que aconteceu
Disse não me assustem
Assustado eu fiquei
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|
66
Acir vivinho da silva
Riu muito antegozando
Ele disse já é três vezes
Alguém anda me matando
Mas eu continuo vivo
Almoçando e jantando
67
Na saída Cecy disse
Não nos deixe meu rapaz
Disse não preocuparmos
E podem dormir em paz
Deus está me dando fôlego
Vou mostrar que sou vivaz
68
Obrigado pelo afeto
Que vocês estão me dando
Cecy disse é verdade
Não estamos te enganando
Amigo é pra estas coisas
Aconselha avisando
69
Nós te amamos muito
És do nosso coração
E se você nos faltar
Nós vamos ficar na mão
Quem vai nos dizer sempre
Estou muito forte e são
70
Ele tinha alto astral
Bom-humor inteligência
A Cecy lhe adorava
Só por vê-lo com freqüência
Quando entrava na sala
Fazia café com urgência
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71
Na véspera de sua morte
Falou-me ao telefone
Nós vamos tomar um vinho
Ou então mudo de nome
É combater os remédios
Que a gente tanto consome
72
Eu respondi é verdade
Não saia daí agora
Precisa me esperar
Tô indo aí sem demora
Antes que a vontade voa
E o vinho se evapora
73
Mas não vai evaporar
Pode deixar comigo
Em menos de dez minutos
Eu estarei aí contigo
Levarei então o claret
Que parece ser antigo
74
Pus telefone no gancho
Para Cecy perguntei
Onde está o vinho velho
Ela me disse eu guardei
Peguei o dito na adega
Pra casa dele voei
75
Bebemos muito felizes
Alegres brindamos vida
Sem pensar que no momento
Saudamos a despedida
Acir num copo de vinho
Acenou com sua partida |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
|
|
|
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|
76
E foi um tintim solene
Veja quanta ironia
Em setenta e duas horas
Acir do mundo partia
Deixando-nos com saudade
Levando sabedoria
77
A lembrança de Acir
Mexe muito com a gente
Ele era um ser humano
Alegre sempre contente
De repente eu o vi
Ficando muito doente
78
Um dia li seus exames
Brinquei com ele dizendo
Acir com tanta saúde
Você acaba morrendo
Será que exagerei
Por isso até arrependo
79
Ele não se aborreceu
Aceitou a brincadeira
E rimos gostosamente
Por falar esta besteira
A maldita diabete
Complicou a sua carreira
80
Laboratórios médicos
Diziam está tudo bem
Não tem nada no coração
Nos rins pâncreas também
E seu fole sopra forte
Parece de um neném
|
|
81
O pulmão parece um fole
O coração é um tambor
Da próstata nem se fala
Macia como um amor
O fígado funciona bem
E a visão é de condor
82
Intestino preguiçoso
Não liga pra isso não
Tome logo um laxante
Resolve a situação
Pra rouquidão e tosse
Use pó de açafrão
83
Foi por isto que gozei
Pois parece brincadeira
Será que tinha levado
Paulada na moleira
Ele estava definhando
E os doutores de bobeira
84
Os doutores alertavam
Diabetes é traiçoeiro
Doença silenciosa
Ataca o corpo inteiro
Quando menos se espera
Joga no despenhadeiro
Fala da cigana
85
E um dia ele ia passando
No viaduto pro aterrado
Uma cigana chegou a ele
E pediu algum trocado
Ele apiedado falou
Tome e coma um bocado
|
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86
A cigana com filhinho
Disse vou ler sua mão
Você é um homem de bem
Não lhe cobro um tostão
Virou a palma pra cima
Ele diz não quero não
87
Cigana do Oriente
Do deserto de Tar
Atravessei vales montes
E aqui eu vim parar
Antes de seguir viagem
Deixa-me te ajudar
88
Eu tenho sabedoria
Herdei dos meus ancestrais
Leio no fundo dos olhos
Vejo suspiros e ais
Como pode sofrer tanto
Sem reclamar jamais?
89
Vamos viajar no tempo
Conhecer o firmamento
Só assim esquecerá
Angústias e sofrimento
Pode até reavivar
A alegria e sentimento
90
Nas linhas do destino
Na palma da sua mão
Tudo está enviesado
Vejo sem hesitação
E vossa a linha da vida
Quebrada de supetão |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
|
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91
E ela falou para ele
Meu Deus! vai já pro doutor
Você tá com urina-doce
E a morte é um horror
Pois a linha da saúde
Prenuncia muita dor
92
Sou uma pobre cigana
Que vive de ler a sina
Você foi gentil comigo
Condoeu-se da menina
E vou rezar para você
Livrar do mal da urina
93
A você vou avisando
Não leve a saúde em vão
E resolva seu problema
Que ainda tem solução
Não pode demorar muito
E nem fazer reflexão
94
Eu tenho premonição
E vivo de déu-em-déu
Gostei muito de você
No meio do povaréu
Se você não se cuidar
Vai ficar um cacaréu
Falou Acir
95
Você leu buena dicha
Por favor pra mim não minta
Alimente sua filha
Porque ela está faminta
E vai embora daqui
Que a patrulha lhe dá tinta
|
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Fala Asséde
96
Acir contou para mim
Estava muito ridente
Mas eu fiquei muito sério
Ele ’tava mesmo doente
Eu pedi a Deus do céu
Pra salvar o padecente
97
Olha a força do destino
Aconteceu foi comigo
O lance da despedida
Não passou despercebido
Em julho dois mil e sete
Acir foi pro outro abrigo
98
Não veremos mais Acir
Seu sorriso seu semblante
As palavras de consolo
A grandeza dum gigante
Na terra Acir Reis dos Santos
Nos céus estrela brilhante
Falou-me antes da morte
Dos medos e do pavor
Primeiro quando morrer
Não queria exalar odor
Segundo não dar trabalho
Aos parentes ou quem for
99
Deus ouviu o seu clamor
Foi encontrado sem vida
Ao lado do sofá cama
Bateu asas em despedida
Com o telefone na mão
Comunicando a partida |
|
100
Pedindo talvez socorro
Para fugir do jazigo
Possível que no momento
Quisesse estar comigo
E fazer a transição
Nos braços do amigo
101
Ângela o viu deitado
Chamou não teve resposta
O carro estava de fora
A mesa estava posta
Precisou adivinhar
Pois ele estava de costa
102
Chamou a mim e vizinhos
Arrombamos o portão
Vimos ele dentro de casa
Caído naquele chão
Meu Deus que aconteceu
Com aquele meu irmão
Fala Geraldinho
103
Sou o poeta Geraldinho
Vou reverenciar Acir
Aprendi a respeitá-lo
Desde quando o conheci
Pois com ele em pouco tempo
Muitas coisas aprendi
104
Às vezes aqui sentado
E junto ao aparador
Eu perguntava pra ele
Como se passa o senhor
E ele dizia meu filho
A perna está um horror |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
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|
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105
E suspendia a calça
Membros sem circulação
Pernas gordas amarelas
Pé achatado no chão
E dizia eu morro disto
Pois tenho muita aflição
Falou Acir
106
Estou muito estressado
O calcanhar azulado
O fôlego está pouco
Eu estou todo inchado
Pois o pé embora fraco
Me carrega no mercado
107
Tô na taboa-da-beirada
Acho que estou no fim
Meus irmãos então sozinhos
Precisam tanto de mim
Estou tombando de lado
Arrastando o borzeguim
108
A barra está pesada
Eu num beco sem saída
São mãozadas de remédios
Diabete não contida
Estou nesta enrascada
Não saio dela com vida
109
O doutor recomendou
Comer com pouca gordura
Contudo eu sou chegado
A comida com fritura
Não resisto a um torresmo
Nem queijo com rapadura
|
|
110
Sou louco por arroz doce
E por leite condensado
Musse de maracujá
Balas de coco raspado
Como quindins de iaiá
Doce de cidra ralado
111
Broa de fubá e ovos
Adoçada com tal qual
Isto eu como guloso
E acho muito legal
Pois este tipo de bolo
Eu sei que não me faz mal
Fala Geraldinho
112
Vou lhe dar conselho amigo
Do fundo do coração
Vai procurar curador
Pra ver a situação
Pois sua perna redonda
Parece mão-de-pilão
113
Sô Acir faça regime
Sério não cace indaca
Açúcar no sangue ai
Cura com pata-de-vaca
E siga suas receitas
Evite deitar na maca
114
Sentei-me pertinho dele
Até pra lhe confortar
E ele estava tão triste
Comecei lhe perguntar
Como que o senhor consegue
Sapatos para calçar |
|
Falou Acir
115
Os sapatos meu amigo
Não estão postos à venda
Somente em Juiz de Fora
São feitos por encomenda
Pra fazer o meu calçado
Desfalco a minha renda
Fala Geraldinho
116
Dias antes de partir
Andava devagarzinho
Eu abri o portão para ele
Recebi-o com carinho
Encostou-se no balcão
Conversava bem baixinho
117
Eu descansarei um pouco
O fôlego tá sumindo
Sentei-me ao lado dele
Ânimos foram surgindo
“Pode ligar pro Asséde
Diga que estou subindo”
Foi última vez que o vi
Isso não me sai da memória
Descanse em paz Acir
Fique no reino da glória
Tua lembrança permanece
Presente em nossa história
118
Pois ele hoje é uma lenda
Venceu a morte numa boa
De noite oramos pra ele
É o seu passo que ressoa
E nos fala zangado
Eu sou fênix que avoa |
→ |
↑ |
|
↑ |
↓ |
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119
Assim meninos e meninas
Amigos irmãos que tais
Acir está no empíreo
Cantando com seus iguais
Abraçando seus amigos
Lendas não morrem jamais
Fala Asséde
120
Teve justa homenagem
Da FOA e Roberto Guião
Grande salva de palmas
Ressoou na multidão
E foi um tributo póstumo
Para Acir na ocasião |
|
121
Vou findar a distinção
Pois sofro profundamente
Onde estará Acir?
Será a alma ardente
Ensinado artes cênicas
Pros santos e Deus clemente
122
Ó Divino Pai Eterno
Expressão do sumo bem
Acolha Acir no céu
Porque é seu filho também
Veja o caminho da luz
Por Jesus Cristo Amém
|
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Fala Acir, no plano espiritual
123
Ah, meus irmãos dotianos
Não chorem por mim em vão
Deus me concedeu entrada
No celestial portão
Toco pra anjos e santos
Solando meu violão |
FIM,
FINIS, THE END, C’EST FINIE, FINITO — ADEUS, ACIR!
|