Matéria Especial - 21/11/2019

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OS PÁSSAROS
por Asséde Paiva

Ontem, pela manhã, cedinho, quase lusco-fusco, pus meu moletom e calcei os tênis. Saí serelepe como sempre para minhas caminhadas. Se quiser viver, andar é preciso, tal a lei. Ouvira ainda deitado o canto dos sabiás, chamando-me a andar. Passei perto de uma arvorezinha, um fícus, onde irritado casal de bem-te-vis fez seu ninho e bravamente mandaram-me que eu me afastasse, obedeci rapidamente.

Passei pela ponte sobre o rio Brandão, que está mais para córrego do que para RIO, caminhei pelo passeio da Praça Brasil, lendo os letreiros das carrocinhas de "fast food". Em minutos passei pela fonte luminosa, cujo iluminamento desapareceu há muito. À minha esquerda, o antigo Centro de Puericultura, outrora pulsante de corações de mamães e seus bebês, hoje fechado pela maldade inerente. Li anúncios de liquidação de eletrodomésticos da LASA (Lojas Americanas). Comprei um jornal na banca de revistas e jornais, segui pela calçada, ao lado do antigo prédio do Mollica; hoje, loja da farmácia Moderna.

Do outro lado, o majestoso Ponto Frio, magazine tradicional e bancos. Segui pela rua Oswaldo Pinto da Veiga, antiga rua quatorze; os vereadores estão aí para dar/mudar nomes de ruas praças e logradouros. Encarei o abandonado Escritório Central, EC, que antes fervilhava de gente; hoje, está tal qual formigueiro que levou formicida, amuado, quase moribundo. Os prédios também morrem e o EC está agonizando devido ao desinteresse/ganância do atual dono da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A mãe CSN, ora privatizada, transmudou-se em madrasta-má.

Hoje, a CSN é um quisto na cidade, não se importa com o povo, com os operários, nem com a cidade do aço. Adoece os cidadãos com sua poeira avermelhada, que sai dos convertedores, produtores de aço incessantes e, também, pelo pó preto da Coqueria e do Alto-Forno. Nós amávamos tanto a Companhia: uma empresa do bem. Ainda divagando, passei pelo atual McDonald’s, substituto do antigo bar Zero-Hora, onde eu tomava um copo de leite antes de subir a Passagem Superior e adentrar na Usina, nos meus tempos de empregado na CSN. Deixei para trás a Praça do Bispo Dom Waldir, o bispo vermelho: um santo homem, para uns; um comunista, para outros; incentivador de grilagem de terras, com certeza.

Então, peguei a alameda sinuosa, delimitada por árvores frutíferas, que não dão frutos pela poluição. O trajeto de pedras avermelhadas é próprio para caminhantes. O empedramento ou calçamento foi feito na administração do Prefeito Antônio Neto. Lâmpadas esféricas, muito bonitas deveriam iluminar todo trajeto para os ginastas noturnos; mas, a maioria quebrada pelos vândalos.

Aconteceu algo que me transtornou o dia inteiro e ainda estou triste: escrevo isto, pra aliviar minha angústia pelo incidente. Foi assim: Ao passar sob uma árvore, acho que uma quaresmeira, escutei piados estridentes de pássaros. Em seguida, como um raio descendo do céu, um pássaro, talvez um trinca-ferro, pousou no asfalto apanhado algo e tentando engoli-lo.

Quem sabe se no alto da árvore a companheira tenha pressentido o perigo iminente? Num átimo, ela voou e pousou ao lado, do seu par, no asfalto, chilreando estridulante, enquanto batia as asas freneticamente, desesperadamente. Nunca tinha visto isto tanto frenesi. Eu senti que o segundo pássaro tentava avisar ao primeiro do perigo iminente.

É como se dissesse: “PERIGO, PERIGO, CARRO NA PISTA”. Eu disse mentalmente: "fuja daí!”. Foi pouco, devia ter gritado ou batido palmas. E aconteceu: veio um veículo a toda velocidade... Uma massa disforme (de carne sangue e penas) manchava o asfalto.

Meu Deus! Perdi meu dia... E os pássaros voaram para Deus.

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–Também gosto de pássaros.
– Por que gosta deles?
– Porque podem voar longe quando as coisas ficam difíceis.

Há uma lei da existência

Sob a esfera luminosa

Partilham da mesma essência

Homem, ave, estrela e rosa.

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