Ontem, pela manhã, cedinho, quase lusco-fusco, pus
meu moletom e calcei os tênis. Saí serelepe como sempre para minhas
caminhadas. Se quiser viver, andar é preciso, tal a lei. Ouvira ainda
deitado o canto dos sabiás, chamando-me a andar. Passei perto de uma
arvorezinha, um fícus, onde irritado casal de bem-te-vis fez seu ninho e
bravamente mandaram-me que eu me afastasse, obedeci rapidamente.
Passei pela ponte sobre o rio Brandão, que está mais
para córrego do que para RIO, caminhei pelo passeio da Praça Brasil,
lendo os letreiros das carrocinhas de "fast food". Em minutos
passei pela fonte luminosa, cujo iluminamento desapareceu há muito. À
minha esquerda, o antigo Centro de Puericultura, outrora pulsante de
corações de mamães e seus bebês, hoje fechado pela maldade inerente. Li
anúncios de liquidação de eletrodomésticos da LASA (Lojas Americanas).
Comprei um jornal na banca de revistas e jornais, segui pela calçada, ao
lado do antigo prédio do Mollica; hoje, loja da farmácia Moderna.
Do outro lado, o majestoso Ponto Frio, magazine
tradicional e bancos. Segui pela rua Oswaldo Pinto da Veiga, antiga rua
quatorze; os vereadores estão aí para dar/mudar nomes de ruas praças e
logradouros. Encarei o abandonado Escritório Central, EC, que antes
fervilhava de gente; hoje, está tal qual formigueiro que levou
formicida, amuado, quase moribundo. Os prédios também morrem e o EC está
agonizando devido ao desinteresse/ganância do atual dono da Companhia
Siderúrgica Nacional (CSN). A mãe CSN, ora privatizada, transmudou-se em
madrasta-má.
Hoje, a CSN é um quisto na cidade, não se importa com
o povo, com os operários, nem com a cidade do aço. Adoece os cidadãos
com sua poeira avermelhada, que sai dos convertedores, produtores de aço
incessantes e, também, pelo pó preto da Coqueria e do Alto-Forno. Nós
amávamos tanto a Companhia: uma empresa do bem. Ainda divagando, passei
pelo atual McDonald’s, substituto do antigo bar Zero-Hora, onde eu
tomava um copo de leite antes de subir a Passagem Superior e adentrar na
Usina, nos meus tempos de empregado na CSN. Deixei para trás a Praça do
Bispo Dom Waldir, o bispo vermelho: um santo homem, para uns; um
comunista, para outros; incentivador de grilagem de terras, com certeza.
Então, peguei a alameda sinuosa, delimitada por
árvores frutíferas, que não dão frutos pela poluição. O trajeto de
pedras avermelhadas é próprio para caminhantes. O empedramento ou
calçamento foi feito na administração do Prefeito Antônio Neto. Lâmpadas
esféricas, muito bonitas deveriam iluminar todo trajeto para os ginastas
noturnos; mas, a maioria quebrada pelos vândalos.
Aconteceu algo que me transtornou o dia inteiro e
ainda estou triste: escrevo isto, pra aliviar minha angústia pelo
incidente. Foi assim: Ao passar sob uma árvore, acho que uma
quaresmeira, escutei piados estridentes de pássaros. Em seguida, como um
raio descendo do céu, um pássaro, talvez um trinca-ferro, pousou no
asfalto apanhado algo e tentando engoli-lo.
Quem sabe se no alto da árvore a companheira tenha
pressentido o perigo iminente? Num átimo, ela voou e pousou ao lado, do
seu par, no asfalto, chilreando estridulante, enquanto batia as asas
freneticamente, desesperadamente. Nunca tinha visto isto tanto frenesi.
Eu senti que o segundo pássaro tentava avisar ao primeiro do perigo
iminente.
É como se dissesse: “PERIGO, PERIGO, CARRO NA PISTA”.
Eu disse mentalmente: "fuja daí!”. Foi pouco, devia ter gritado ou
batido palmas. E aconteceu: veio um veículo a toda velocidade... Uma
massa disforme (de carne sangue e penas) manchava o asfalto.
Meu Deus! Perdi meu dia... E os pássaros voaram para
Deus.
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