REIS CIGANOS
Parte II

por Asséde Paiva
Rev. Acir Reis

postado no Benficanet em 22/08/2017

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Já inventaram tanto rei, que é rei pra todo lado
Foi um tal rei do café, e também o rei do gado.
Tem rei pelo mundo inteiro, comandando até nação
Tem o rei do futebol e até rei da canção. (Teo Azevedo)

“Todo o homem traz consigo um destino de cigano. Por mais que os vínculos o prendam ao seu agro, como raízes que precisam de chão familiar para dar corpo a arvore, o certo é que a inquietude, ou seja lá o que for de nome mais inspirado...procura o espaço sem estremas, ao alto e ao largo até onde puder chegar. (...) por mais que os anos o gastem e as canseiras ou desenganos o segurem aonde está, ainda teima em dilatar os olhos para lá dos portões do seu horizonte.” (In PROSAS SOLTAS, de Fernando Namora)

I have thought that we chals and cuckoos are alike in many respects, but especially in character
Everybody speaks ill of us both, and everybody is glad to see both of us again.

[Penso que ciganos e cucos  são parecidos, de muitos modos, especialmente no caráter.
Todos falam mal de nós e todos ficam alegres em nos rever.]

(Jasper, um cigano, conversando com George Borrow, in Romani rye.)

Neste trabalho manteremos a mesma linha de pensamento, isto é, total isenção no que diz respeito à existência ou não de reis ciganos. Também evitaremos comentários que induzam o leitor ou leitora a optar por esta ou aquela vertente. Na verdade, limitaremos nosso trabalho a traduzir o que os doutos já disseram a respeito deste tema.

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Começaremos pelas páginas 93 e 94, do livro Gypsy Demons and Divinities de Elwood B. Trigg, Citadel Press, N. J. 1973.

       [....] um segundo rito merece ser mencionado é o assim chamado coroação de reis e rainhas ciganos. No passado muito romanticismo envolveu o assunto reis e rainhas e isto frequentemente prova a dificuldade de separar o fato da ficção.

            A crença do não-cigano na realeza cigana, sem dúvida, começou quando da sua primeira chegada na Europa quando eles se denominaram condes duques e príncipes. Desde então a crença foi encorajada por dois fatores. Primeiro, os jornais, a fim de apelo aos seus leitores de imaginação romântica, que distorceram por ignorância ou intencionalmente a verdade que seus repórteres realmente viram. Segundo, no passado, os ciganos encenaram pseudocoroações a fim de criar oportunidade de cobrar entradas, vender bugigangas e feitiços e ocasionalmente bater carteiras. Foi descoberto por eles que alguns crédulos não-ciganos atenderiam entusiasticamente à perspectiva de ver o que eles acreditavam ser uma real coroação cigana.

            Melhor do que falar em realeza cigana, seria mais correto falar em chefes de famílias, chefes ou voivodes, como os atuais líderes podem ser chamados. Tais chefes podem ter jurisdição sobre poucas famílias ou em alguns casos, centenas. Geralmente eles são homens que são conhecidos pelo seu senso de justiça e sabedoria, bem como sua lealdade ao povo e à cultura. Tais fatores como o nome de sua família, força física e riqueza, também são importantes. Na maioria dos casos o chefe, como representante do grupo, tem autoridade para infligir castigo corporal e se necessário pronunciar a exclusão de um membro do grupo. É também o chefe, junto com os mais velhos, que decide questões relativas ao bem-estar do grupo como um todo. Em tais casos, o poder do chefe depende quase sempre inteiramente do respeito que seu povo lhe tem. Se ele tem, sua influência e poder pode ser considerável. Embora em alguns exemplos o papel do chefe possa ser hereditário, muito freqüente é a eleição por um período de tempo ou vida.

            Na ocasião a forma de entronização ou o rito de indicação é praticado para instituir um novo chefe. Clébert ilustra um ritual na descrição de tal evento entre ciganos romenos. Seguindo à eleição, o novo chefe é sentado em uma cadeira que é separada por uma corrente dos demais. Isto é feito a fim de simbolizar a posição do coroado que ocupa tal posição e tem autoridade de governar sobre os demais. Mais tarde, um juramento de sangue é feito pelo corte do pulso esquerdo do antigo e do novo chefe. Ambos juntam seus pulsos a fim de misturar seus sangues e ritualmente transferir a continuidade de poder entre o novo e o velho chefes.

            Poucos destes chefes no passado tiveram, na verdade, genuína pretensão de ser verdadeiros reis ciganos e apregoaram liderança sobre todos os ciganos europeus ou americanos, e em alguns casos sobre todos ciganos no mundo. Tais ambições, contudo, foram infundadas e geralmente não foram bem recebidas pelo povo que é demasiadamente orgulhoso de sua liberdade individual e lealdade familiar, para permitir ser governado por um só líder. Consequentemente, tais pretensões de realeza foram curtas, frustrantes e, em alguns casos, cometeram-se assassinatos.

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Em The Gypsies de Werner Cohn, editora Addison Wesley Publishing Company, está a afirmação: “Eu encontrei conclusões similares à cerca de domínio e de autoridade: Os ciganos não têm líderes, não têm comitês executivos, nem movimento nacionalista, nem reis ciganos".

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Há quase 100 anos (março de 1909), a Revista Ilustração Portuguêsa publicou excelente artigo Os ciganos, p. 314-319, onde lemos este excerto: “Nos casamentos têm os ciganos o seu ritual pagão, mais hábil, porque se sua moral é larga para os delitos de roubo e assassínio, é estreita, em demasia talvez, para a infidelidade à raça e daí vem o mistério  tão bem guardado da sua origem e do seu idioma e o abandono total da mulher que atraiçoa o companheiro. Essas lindas ciganas de olhos de brasa, cujos corpos nervosos têm requebros lânguidos de bailadeiras, podem viver aquela vida de misérias, atravessar os caminhos mais terríveis, inspirando os maiores amores, que são sagrados sempre para o cigano até a hora do consórcio, que para se fazer necessita da afirmação da sua virgindade feita por três  chefes. Uma velha da tribo, a quem chamam a Peliche, recolhe-se por momento com a noiva e trás em pouco um lenço  a que se dá o nome de lençol de honra  a prova duma honestidade que ela jura ter existido naquela que vai ser a esposa do cigano. Três chefes, porque as tribos são governadas e os ciganos têm reis [grifo nosso] dão licença para o enlace. Desde logo se atira ao ar a bilha tradicional cujos cacos se guardam como se em vez de restos do barro fossem de rara louça e assim casados aqueles dois entes que vão fazer a sua vida por essas estradas sem fim do mundo lado a lado [....].” A cerimônia do casamento continua, mas nosso interesse é nos reis ciganos então saltemos páginas e ... “há uma ansiedade de saber se não irá ali um rei, um dos seus soberanos, aquele que tem todo o poder, a quem vários agrupamentos obedecem e que em França é designado pelo título de rei d´Arnac... há também vontade de lhe perguntar se ela não será a soberana das ciganas, aquela a quem chamam a rainha de Coestre...” Em relação ao artigo supracitado, paremos por aqui.

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Martin Block, em seu livro Moeurs et coutumes des tziganes, Paris, Payot, 1936, 261pp., trata profundamente da questão cigana em todos os seus aspectos. Nas páginas 151-162, descreve com riqueza os detalhes da organização da tribo (L’Organisation de la tribu), e é neste capitulo que fala do tema que nos interessa mais de perto: reis ciganos. Vamos transcrever, traduzindo para nossa língua, poucas linhas do livro que está em francês.

Não existe organização unificada, internacional, que agrupe os ciganos do mundo inteiro. Jamais houve e jamais haverá, apesar das tentativas emanadas sejam dos próprios ciganos sedentários, sejam de movimentos comunistas estrangeiros às suas tribos. Já no seio de um determinado país, eles não têm organização de conjunto, sua dispersão através do vasto mundo civilizado torna isto impossível. Por outro lado, eles resistem instintivamente a todo laço baseado em obrigações não conformes ao gênio de seu povo.

O cigano conhece seus parentes, as pessoas de sua tribo. Onde quer que vão, os ciganos os acolherão com hospitalidade como a um irmão, phral. Isto lhes basta. Ele carrega consigo a lei dos ciganos.

Em cada país, os ciganos formam um ou vários grupos, cada grupo é um todo, algo imutável. Algumas famílias deste grupo podem deixar o país, depois voltar ou ir formar outros grupos. Os direitos de viagem e a mendicância pertencente aos primeiros instalados serão quase sempre respeitados pelos recém-chegados. Caso contrário, se desencadeia um conflito sangrento. Após isto, o grupo estrangeiro cede lugar ou sela a paz com os anciões; a batalha é então esquecida, com se o bom entendimento jamais tivesse tido qualquer sombra.

Os territórios remanescentes e a criação de novos estados após a última guerra acarretaram certo reagrupamento de tribos ciganas. Os ciganos húngaros, da Transilvânia não podiam mais percorrer este país tão livremente quanto no passado. Os da Romênia tiveram que se entender com as tribos de regiões húngaras precedentes; sem, no entanto, mudar de chefes ou deslocar seus centros. Nos países em que os ciganos são numerosos, encontram-se, além das tribos distintas há muito tempo, diversos outros grupos que devem sua individualidade seja a seu dialeto particular, seja a sua região de origem, seja à época de sua penetração; eles têm uma esfera de circulação bem delimitada e continuam totalmente independentes uns dos outros. Assim, na Europa Central e Ocidental, ao lado das tribos antigas que dividem o território em que circulam, há as mais recentes aparições vindas da Hungria, da Romênia e de outros países sul-orientais. Estes grupos vivem justapostos, às vezes eles se visitam mas tendem a ir mais longe e executar somente trabalhos que não concorram com os antecessores. No sudeste europeu e na Hungria, a língua e ocupações dos ciganos permitem distinguir entre eles cinco grupos independentes que evitam com maior cuidado entrar em contato entre eles. Cada um ocupa seu território, têm seus chefes particulares e sua esfera de circulação; eles exercem trabalhos especializados. Isto já seria suficiente para tornar impossível qualquer unificação, ou uma simples federação entre todos os ciganos da Europa.

Em 1930, a imprensa divulgou uma notícia inexata: os ciganos europeus, dizia ela, acabavam de eleger um novo rei. A “coroação” desse personagem, Michel II, havia se realizado em Piastovo, próximo de Varsóvia, em presença de numerosos delegados de ciganos da Polônia e do estrangeiro. Até o marechal Pilsudski, presidente da república Polonesa, se fez representar na cerimônia (autorizada pela polícia de Varsóvia), o qual tinha reconhecido a regularidade da eleição.

Mas aqueles que conhecem os ciganos consideram esta narrativa exagerada: trata-se apenas do chefe de certas tribos. Não há nada entre eles que pareça uma realeza de fato, primeiramente, porque abaixo da tribo nenhum grupamento mais vasto se constituiu, em segundo, porque a penetração em diferentes países aconteceu em levas sucessivas, o que resultou num tipo de estratificação social que torna impossível a reunião do conjunto de ciganos sob um único soberano. O fato que na Polônia, no ano seguinte, foi proclamado um segundo “rei” dos ciganos, a precedente eleição havia sido anulada, mostrando claramente o quanto esta pretensa realeza está sujeita à dúvida. As tentativas deste tipo só aparecem entre grupos que se tornaram sedentários ou semi-sedentários; não são mais ciganos no sentido integral da palavra.

Alguns ambiciosos, querendo aproveitar a tendência geral da época, preconizam a idéia nacional e reivindicam para seu povo o direito à existência independente, procurando assim manifestar sua unidade aos olhos do mundo exterior. Houve congressos em Munique, Moscou, Bucareste e Sófia; a partir daí as decisões foram enviadas aos governos, visando à melhora da condição econômica dos ciganos. Muito frequentemente fanáticos perseguem seus próprios interesses políticos, aliás estrangeiros em sua maior parte à raça cigana, foram instigadores desses movimentos. O rei George V, da Inglaterra, recebeu o título de “colega” do rei cigano “europeu”, que lhe apresentou um requerimento, pedindo para ajudá-lo (e a seus correspondentes), a fundar uma colônia cigana na África do Norte.

Cada grupo, tendo consciência de constituir uma tribo, tem a liderança de um chefe, desprovido de todo privilégio de nascença, e vivendo com os seus absolutamente como qualquer outro cigano. Não existe nenhuma hierarquia entre chefes. Eles são todos iguais entre si. Falar de “rei” em relação a ciganos é transportar a este povo uma instituição absolutamente estrangeira a seu gênio igualitário. O estrangeiro não saberá quem é o chefe da tribo; se lhe interrogar, dirá que a tribo não tem chefe. Em caso de conflitos com a polícia ou para falar com as autoridades, pergunta-se se o porta-voz dos ciganos não seria o chefe; jamais se poderá ter esta certeza.

Logo que surgiram, nos meados do século XV, na Europa Central e Ocidental, chamavam-se chefes ou eles próprios se denominavam com as expressões da época: duques, condes, ou ainda bulibaches. Não se sabe exatamente se esses chefes eram ciganos ou estrangeiros pré-colocados em observação, que lhes haviam acompanhados desde a Romênia e Hungria recebendo deles um tributo. Certo personagem ou voivode era o representante legal de um grupo contando cinco ou vinte e cinco tendas. Ele era encarregado de manter a ordem, de julgar as contestações e era responsável pelos furtos. Desde o século XIV, em Corfu, se via, em 1o de maio, os ciganos meio sedentários desfilarem ao som de tambores e flautas, carregando a árvore de maio diante das casas daqueles que os consideravam como servos.

Em 1422, o duque André, hóspede em um hotel de Bolonha, descia acompanhado de sua trupe diante das portas da cidade. Podia ter sido um cigano autêntico ou um inspetor estrangeiro observando-os na Hungria. Em 1419, um grupo chegou a Augsburg, embora tivesse apenas 70 homens, tinha dois “duques” e alguns “condes” Em 1439, um grupo heterogêneo surgiu na Baviera tendo com líder um rei de nome Zundel.

Em todo caso, hoje, como antigamente, toda tribo tem seu chefe, cuja autoridade se estende seja a centenas de famílias, seja a um pequeno grupo de 25 tendas. Este personagem deve conhecer a fundo o país por onde tenha circulado muitas vezes; é necessário também que ele seja dotado de um caráter irrepreensível e que goze de plena confiança entre seus “camaradas”. Ele é escolhido. Assim, a tribo tem uma grande liberdade de movimentos, a polícia não lhe observa muito; essa eleição é acompanhada de uma grande agitação. Sem proceder um escrutínio, se conhece por chefe aquele que reúne as melhores qualidades ciganas. Na maioria dos casos é um homem na pujança da idade. É sempre uma personalidade cuja superioridade é instintivamente percebida por este povo de primitivos.

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Jules Bloch escreveu Les Tsiganes [Os ciganos] editado em Paris, Presses Universitaires de France, 1953, com 119 pp. Ele tem alguns pontos importantes, que traduziremos (parte) a seguir (p.101-105). Trata-se do item Chefes e juízes que é relacionado ao nosso tema.

Geralmente, grupos de famílias em número variado formam uma unidade tribal que tem seu chefe. Na Romênia, este chefe pode comandar desde grupos de 20 a 25 tendas até centenas de famílias que, periodicamente, se reúnem nos mesmos pontos. É neste momento que se exerce o poder dos chefes. A instituição, normal entre os nômades, pode retomar o vigor entre os sedentários quando circunstâncias se prestam a isto.

Na Transilvânia, a autoridade se divide em dois níveis. O grupo que corresponde ao que acabamos de ver é aquele do Maliya ou “Companhia”, comandado pelo Saibijo (os nomes variam de acordo com o país) ; é ele quem decide medidas de interesse coletivo e litígios de importância comum; pode convocar os anciões de diversas famílias, ou o grupo inteiro. Seu mandato não é eletivo, mas repousa sobre um consentimento geral, adquirido anteriormente entre famílias; este será um homem idoso mas ainda vigoroso, ao qual se tem simpatia e respeito; aliás, susceptível a ser deposto se não satisfizer de modo geral. Na vida rotineira ele não se distingue do resto da tribo; ele não recebe remuneração; seu único privilégio era, por volta de 1850, o direito à tenda de honra, e a um penoso trabalho de madeira e água, no momento de cada nova instalação.

Ele tem (ou pelo menos tinha) abaixo dele o voivode que, não apenas representa a tribo mas reina sobre ela; o voivode confirma a eleição do saibijo, dando-lhe de presente um porco jovem e apresentando-lhe os seus administrados; nos casos graves, os saibijos deverão se dirigir ao voivode que, por sua vez, convocará todos os seus saibijo para apreciação do caso em conselho. É o voivode que representa o grupo diante do governo. Principalmente representava antigamente, pois a política governamental conseguiu interditar os grandes grupamentos e a função do voivode desde então não tem tanta utilidade. Ele tinha direito ao cetro e botões de prata, a uma grande taça prismática, usava barba e era-lhe permitido casamento fora da tribo. Mesmo a descendência de anciões voivodes conserva certos privilégios.

O voivode era eleito, mas dentre a descendência de anciões voivodes o símbolo de sua autoridade era o chicote, arma que os ciganos consideram como a mais terrível (M. Maximoff descreve num romance um duelo de morte, o chicote na mão direita; a faca, na esquerda).

A descrição acima anterior vale também para a Alemanha. O fato de que havia também dinastias de voivodes distintas, por particularidades diversas do resto da tribo, faz supor que se trata de uma instituição híbrida, talvez de origem governamental. De fato, voltando-se ao curso da história, encontram-se condes ou nobres que, em certo numero, não são ciganos, mas em realidade representantes do Estado.

Em relação à Hungria e Transilvânia, não temos indicação precisa. Ao lado de quatro grandes voivodas, nobres do país, havia voivodes de nível inferior, escolhidos pelos próprios ciganos, dentre os descendentes de voivodes passados: esses eram ciganos. Encontramos aqui escalonamentos entre modernos voivodes e saibijo e a confusão de termos explica que se encontra, mesmo de tempos em tempos, um voivode ou um conde cigano, desde o século XV.

No conjunto, pode-se dizer que os ciganos da Europa Central eram governados segundo um sistema uniforme em dois níveis: chefes escolhidos por ele e delegados do poder central que, ao mesmo tempo perseguiam, sabiam observar e explorar. O mesmo sistema funcionava na Europa Ocidental? É provável. Em todo caso, tem-se a prova de sua existência na Escócia do século XVI. E no que se refere à Inglaterra, vê-se em Doncaster a tumba de um rei dos ciganos, James Bosvil ou Bosville [Boswell] onde, por volta de 1820, os membros desta família “real” os Boswell, iam todos os anos em peregrinação. Uma das formas da cerimônia que eles praticavam era esvaziar um pote de cerveja quente sobre a tumba.

Na Polônia, parece que a dupla função se perpetua. Por exemplo, em 1948 houve um “grande chefe” juiz e guia espiritual, um velho chamado “Zoga”. Ao mesmo tempo, um “presidente” Rudolf Kwiek, eleito em 1946, e continuando durante um tempo a trabalhar como caldeireiro; é o descendente de uma dinastia Kwiek, vinda bem recentemente da Romênia que em certa época já forneceu sete “reis” desde Michel, eleito em 1930. A heráldica registrada dos Kwiek, tem um corvo trazendo uma aliança no bico. Rudolf foi reconhecido pelo Estado como presidente do Conselho Mundial dos Ciganos: a bem da verdade, não se sabe bem em que consiste esta função.

Em 1937, o governo deu autorização para coroação de Janus Kwiek, e o arcebispo metropolitano da igreja ortodoxa oficiou esta cerimônia, onde não faltou o “Deus proteja o rei!”; segundo o correspondente do Manchester Guardian, o governo enviou um contingente de polícia três vezes maior que a multidão de ciganos entusiastas, sendo que alguns ciganos vieram a pé dos Montes Cárpatos, a uns mil quilômetros de Varsóvia. Sob uma nova forma, encontra-se aqui a intervenção do Estado ao lado do chefe moral da tradição indígena. É necessário acrescentar que alguns consideram toda essa história como chacota. Em todo caso, ela teve êxito desta vez.

A instituição autêntica é o chefe indígena, que é juiz ao mesmo tempo. É a única que se vê funcionar com os Sintos na Alemanha, onde o “encarregado da verdade” ou “aplicador de justiça”, preside um grupo de famílias aparentadas, conhecida pelo nome de hermana nação ou hamanation, que de tempos em tempos se reúne para colocar em pauta todos os negócios comuns, regularizar matrimônios, presidir o tribunal.

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José Leite de Vasconcelos em sua obra Etnografia portuguesa, vol. IV, pp. 351-419, aborda a questão cigana em Portugal, vamos transcr3ever aqui o que nos diz sobre reis ciganos no subcapítulo: quadrilhas, condes, reis.

“Os ciganos vivem em quadrilhas e, segundo se diz, em regime comunitário. Não têm chefe a quem obedeçam. Ouvem os conselhos dos mais velhos e dos mais ricos, de quem dependem em ocasiões de aperto. Os grupos mantêm-se isolados uns dos outros e juntam-se apenas nas feiras, a que geralmente concorrem. Essa falta de coesão deve-se, sem dúvida, a não existirem entre eles laços religiosos, políticos e econômicos e à sua incultura.

Não prestam entre nós serviço militar.

Antigamente cada quadrilha ou horda era governada por um conde. João de Barros, no séc. XVI, ao tratar dos calândares da Índia, informa que ‘grande número deles elegem um a que obedecem, à maneira que os ciganos fazem a seu conde’. E já nos referimos a um conde de ciganos que no séc. XVII foi muito reverenciado por um vereador da Câmara de Elvas.

Lê-se que em alguns países da Europa Central têm um rei que os governa despoticamente.

Em 1937 foi eleito e coroado, em Varsóvia, pelo arcebispo ortodoxo Theorowicz, rei dos ciganos de todo mundo, um tal de Janusz Kwiek. Depois das pomposas e teatrais cerimônias de aclamação e coroação, o novo rei, fez entre outras, as seguintes declarações: ‘o meu programa consistirá em obter para os ciganos um território nacional. Entregaremos uma petição ao Ministério dos Negócios Estrangeiros da Polônia, solicitando do Governo Polaco que interceda a nosso favor junto da Sociedade das Nações. Procurarei igualmente falar com o senhor Mussolini, para lhe pedir que nos permita fundar um Estado na Abissínia’. A imprensa do mundo faz referência, de vez em quando, a este justo anseio dos elementos mais progressivos do povo cigano.

Entre nós, porém, não se reconhecem esses soberanos distantes. Em artigo do Diário de Lisboa de 25 de novembro de 1938, o cigano Antônio Maia, figura de relevo da colônia cigana lisboeta, alude de modo despiciente um rei existente ‘lá para a Hungria, bastante patusco e cabotino, que se deixa fotografar como tal’”.

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Tínhamos dado por encerrado este trabalho e nos dando por satisfeitos em ajudar nesta questão sobre a realeza cigana. Achávamos que nada ou quase nada teria escapado de nossa pesquisa. Ledo engano! Há sempre novas lavras para um garimpeiro pertinaz. E foi o que nos aconteceu. Dávamos um costumeiro passeio pelas ondas da www, quando resolvemos pesquisar, em inglês, o que tinha na rede sobre reis ciganos e fizemos o que devíamos ter feito desde o início: digitamos king of the gypsies e descobrimos o mais rico veio sobre ciganos, na Wikipedia, the free encyclopedia. Abriram-se-nos dezoito páginas sobre este delicioso tema: reis ciganos. Passamos a transcrevê-lo em resumo, porque a torrente de informação é grande, mas quem quiser conhecê-lo na íntegra é só ir ao site

http://en.wikipedia.org/wiki/King_of_the_Gypsies que está em inglês bastante claro e fácil. São 90 indivíduos denominados reis, rainhas, duques, condes, lordes, voivodes etc., dando-se os nomes dos países/nações onde exerceram seus poderes. Nós seguiremos esta orientação, informamos que alguns nomes são detectados em outros países, o que nos indica que os mesmos chefes por eles passaram em épocas diferentes. Quanto à introdução do artigo nada há de novo mas vamos apresentá-lo na totalidade para que todos tenham a mesma idéia do que se fala.

DIÁSPORA CIGANA / ESPASA-CALPE

Ion Cioaba, “o rei dos ciganos”, em família (Revista Manchete, 24/10/1992)

Ion Cioaba, autoproclamado “rei dos ciganos” (Revista Manchete, 24/10/1992)

King of the Gypsies [Rei dos ciganos]

Wikipedia, a enciclopédia livre, com adaptação e tradução nossa.

O título Rei dos ciganos tem sido reclamado ou dado por séculos a diferentes pessoas. Ele é culturalmente e geograficamente específico. Pode ser herdado, adquirido por aclamação ou ação ou simplesmente reivindicado. A extensão do poder associado ao título varia; pode ser limitado a pequeno grupo em um lugar específico, ou a muitos, em grandes áreas. Em alguns casos a alegação é claramente um exercício de relações públicas. Como o termo cigano é usado em diferentes modos, rei dos ciganos pode ser algo não relacionado com os roma [ciganos].

Tem sido sugerido que em lugares onde foram perseguidos pelas autoridades locais, o título de rei dos ciganos é dado a um indivíduo de baixa condição, que assume a posição e o risco ad hoc de fazer a ligação com o gadjê (não-cigano). A prisão de tal “rei” limita-se a magoar o cigano que assumiu a função.

Escócia

  • Anthonius Gagino — conde do Pequeno Egito, recebeu uma carta de recomendação do rei James IV para o rei da Dinamarca, em 3 de julho de 1505. Alegou estar em peregrinação. Um “Anthonius” foi registrado em Estocolmo em 1512, liderando um grupo de 60 “Tártaros” vindos do Pequeno Egito.
  • George Faw — capitão, acusado por dois ciganos como ladrão, em Aberdeen, em 1539.
  • Count Martin — estava munido de um salvo-conduto do rei James IV, que o descrevia como sendo do Pequeno Egito.
  • John (Johnnie) Faa — líder dos egípcianos ou ciganos na Escócia. A ele foi dada uma carta com selo privado do rei James IV, em fevereiro de 1540, e renovado em 1553.
  • Johnne Wanne — filho e sucessor de Johnnie Faa. Foi-lhe concedida real autoridade sobre todos egípcios na Escócia, em maio de 1540. Em 1612 eles estavam entre os transportados para Virgínia.
  • William Faa II — rei dos ciganos, morto em Kirk Yetholm em 1883, com a idade de 96 anos.
  • Charles Faa Blythe — coroado rei em 30 de maio de 1898, com a presença de mais de 10000 descendentes de Kirk Yetholm. Morto em 1902. Alegava descendência do lorde ou conde do Pequeno Egito. Fugiu com a condessa de Cassiles.
  • Billy Marshal (1672-1792) — alegava ser rei dos ciganos, no sudoeste da Escócia. Casou 17 vezes, tinha uma multidão de filhos ilegítimos. Dizia ter sido pai além dos 100 anos.

Inglaterra

  • Duke Andrew — quando os grupos que chegaram à Inglaterra assumiam ser egípcios caminhantes, o duque André os liderava.
  • George Portingale — “capitão dos egípcios”, preso em Wigan, em 1601.
  • Robert Hern and Elizabeth Boswell — casaram-se em 1687 em Camberwell e foram descritos como “rei e rainha dos ciganos”. Ele seria o mesmo Hern escolhido como rei de um grupo em Warwickshire, em 1673.
  • John Mendall — liderou uma ribelião em Kent. Foi capturado e morto.
  • Bluebeard and Hugh Roberts — Bluebeard foi capitão, capturado e executado. Roberts juntou 100 vagabundos e devassos em Kent, mais 400 baderneiros e invadiu Southwark, depois se dispersaram. Reuniam-se a cada três anos. Foi morto em 1461.
  • Jenkin Cowdiddle — dizia-se o senhor, era audacioso e feroz, ordenava que todos pedintes lhe dessem os ganhos de sábado. Era um fanfarrão, possivelmente uma ficção.
  • Spising — governou 11 anos antes de ser enforcado.
  • Puffing Dick — governou oito anos antes de morrer de varíola.
  • Laurence Crossbiter (aka Long Laurence) — eleito líder aos 50-60 anos.
  • Richard Skelton — um dos conselheiros de Warbeck. Mencionado por sir Francis Bacon.
  • Cock Lorel — eleito sucessor pelo Conselho Geral. O mais notório lutador com navalha. Governou até 1533.
  • Giles Hather — chefe de regimento ou camaradas egípcios, no norte em torno de 1528. Cavalgava em grupos de mais de cem homens e mulheres, com cavalos, suas faces escuras e praticando prestidigitação e leitura da sorte pelas linhas da mão, deliciando o povo com suas roupas.
  • Kit Callot — “a rainha dos egípcios”. Acompanhou Giles Hather.
  • Clause Patch — “rei dos pedintes”. Sua eleição e coração foi publicada por Francis Kirkman no The Wits, ou Esporte pelo esporte, em 1662.
  • Margaret Finch — rainha do acampamento em Lambeth, na área conhecida como Monte Cigano. Sua trilha pode ser traçada até 11 de agosto de 1668.
  • Bampfylde Moore Carew — alegava ter sido eleito após a morte de Clause. Boswells — foi por séculos na Inglaterra umas das maiores e mais importantes famílias ciganas.
  • James Boswell — enterrado em Rossington, perto de Doncaster em Yorkshire. O Dicionário Topográfico de Yorkshire (1882) diz: No átrio da igreja tinha uma pedra a qual ainda está lá, demarcando onde foi enterrado o corpo de James Bosvill [Boswell] o rei dos ciganos, que morreu em 30 de janeiro de 1708. Por anos era costume dos ciganos, vindos do sul, visitar sua tumba, anualmente, e realizarem algum dos seus ritos, um dos quais derramarem garrafa de cerveja sobre o túmulo. Esta rotina durou mais de 100 anos.
  • Henry Boswell — rei dos ciganos, morto em 1760, com a idade de 90 anos. Foi enterrado em Ickleford perto de Hitchin.
  • Hanniel Boswell — filho de Francis Boswell. Batizado em Londres em 1583 e intitulado rei dos ciganos.
  • Daniel Boswell — está enterrado na igreja de Santa Helena, em Paris. Viveu de 1737 até 1827, morreu com a idade de 90 anos.
  • Louis Boswell — enterrado em 1835 na igreja de Eastwood. O registro diz Viajante.
  • Henry Boswell — rei dos ciganos morto em 1824, em Stamford, Lincolnshire.
  • Jacob Rewbrey — alías rei dos ciganos, originado de Santa Margarete Westminster. Ladrão de estrada. Foi expatriado.
  • John Nicholl Thom — considerado por ele mesmo Lord Courtenay e rei dos ciganos. A Câmara dos Comuns designou-o ao Seleto Comitê, em 1838. Parece que fugira do asilo de loucos de Kent.
  • Edmund Mashiter — morreu em Bolton em 1811. Ele foi noticiado como rei dos pedintes.

Nota: No cemitério da igreja de Maria, há uma tumba comemorativa ao cigano desconhecido: rei dos ciganos.

  • Harry Burton — descrito como rei dos ciganos morto em Workhouse, em Wincaton, com 94 anos.
  • Marty Cooper — ensinou a língua romani em 1870 a Charles Godfrey Leland, folclorista americano e fundador da Sociedade Folclórica Cigana. Lelande assegurava que ele (Marty) era rei dos ciganos na Inglaterra.
  • Esau Smith — foi conhecido como rei do remendo negro em Birminghamand. Depois de sua morte em 1901, sua viúva Henty foi eleita rainha. A caravana do rei e da rainha foi queimada, em ritual após a sua morte em 1907.
  • Xavier Petulengro — descrito como rei dos ciganos, na celebração de um casamento cigano em Baildon, em Yorkshire em 1937, entre seus sobrinhos Leon Petulengro e Ileana Smith.
  • Gilderoy Scamp — viveu em Folkstone, Kent.
  • Billy Marshall — é descrito como rei dos tinker ciganos.
  • KTB “Tommy” (Tom) Doherty — fez campanha pedindo tratamento equânime para os viajantes da Irlanda, em 1950, e na Inglaterra, em 1960. Nasceu em Dublin, é participante da corte européia de direitos humanos. Ele disse que foi chamado rei dos ciganos depois de se tornar conhecido por suas campanhas.
  • Bartley Gorman — bem conhecido como lutador, sem luvas, em Staffordshire, conhecido como rei dos ciganos. Em seu funeral, em 2002, compareceram centenas de ciganos. Ele era orgulhoso de seus antepassados: Seu bisavô foi Bartley boxeador, rei dos viajantes, na Irlanda no século 19; seu avô, Bulldog Bartley também foi lutador.
  • Don Adams — outro lutador, em Waltham Cross, Londres, também conhecido como rei dos ciganos.

 

País de Gales

  • Abram Wood — foi reputado rei dos ciganos, nasceu antes do século dezessete. Seus descendentes incluem músicos que ajudaram a manter vivas as tradições musicais, que foram para o submundo durante a efervescência metodista.

 

França

  • Dukes Andrew and Michael do Pequeno Egito — registrados como líderes do grupo de Macon, França, em 1949. O mesmo nome (André ou Andréas) possivelmente a mesma pessoa é registrado outra vez em Bruxelas e Deventer e em 1421 em Mons. Mons foi também visitada pelo duque Miguel de Latingham do Egito, assegurando ser seu irmão, que tinha já estado em Tournai, onde foram registrados como tendo rei e lordes que eles obedeciam. De forma que ninguém podia puni-los. Em alguns lugares eles exibiram carta de autoridades como Sigismundo, imperador do Sacro Império Romano. Em 1422, André e Miguel apareceram em Basle e Bolonha, afirmando que estavam a caminho de Roma, para ver o Papa. Lideranças ciganas apareceram mais tarde em Paris, Amiens (1427) Douai, Roterdã e Utrecht (1429), Fermo e Middleburg (1430) e muitos outros lugares, armados com salvos-condutos papais. Quase todos forjados, como se vê num exemplo existente.
  • Count Thomas — visto em Amiens com salvo-conduto Papal em 1427, e provavelmente em Tournai em 1429. Ele podia ser o nobre príncipe Thomas, conde do Egito Menor, que recebia benefícios em Nevers em 1436 e Troyes em 1442. O conde Thomas também apareceu em Milão em 1457, com o título de Pequeno Egito, na Boêmia, com salvo-conduto do rei. Variantes deste título foram usadas por líderes nas cercanias de Avinhão em 1465.
  • Count Philippe — chegou em Nevers em 1451; o nome também é registrado em Grenoble.
  • John & George — ambos obtiveram donativos em Arles, como fez um líder desconhecido antes deles.
  • Count Jean-Baptiste Rolland do Pequeno Egito — receberam cartas de proteção em 1558.
  • Antoine Moreul — capitão do Pequeno Egito, sob proteção de Francisco I.
  • Count Palque — recebeu proteção similar por Henrique II, em 1553.
  • De la Grave — capitães David, Pierre e João de la Grave foram visorts em vários lugares na França no início do século XVII.

 

Países Baixos

  • Count Anton — foi a Nijmegenaround em 1500.
  • Count Martin Gnougy e count Wilhelm e Anthonius — alegaram vindos do Pequeno Egito e foram favorecidos com salvos-condutos pelo supersticioso Carlos, Duque de Guelders em 1496, 1506 e 1516. Conde Martin alegou ter sido intimado pelo Papa, e comprometeu-se a fazer peregrinações.

 

Alemanha

  • Duke Panuel — morreu na Baixa Saxônia em 1445.
  • Count Michell — a ambos foram dados salvos-condutos em Seefeld, em 1442 e Bensbgerg, em 1443.
  • Count Dederich — foi-lhe dado salvos-condutos, em 1448 e 1454.
  • Count Petrus — morreu perto de Bautna, em 1453.
  • Count Antoni — tem uma cota-de-armas na sua tumba, em Brotzingen, em 1552.
  • Count Johann — foi morto em Pforzheim, em 1498.
  • Count Bartholomeus, do Pequeno Egito — foi-lhe dado salvo-conduto pelo conde Palatino em 1472.
  • Duke Ernst e count Ambrosius — foram aprisionados em Hohengeroldseck, em 1483.
  • Count Nicolaus Caspar, do Pequeno Egito — concederam-lhe cartas de proteção na Saxônia, em 1488.

 

Espanha

  • Don John, do Egito Menor, e count Tomas, do Pequeno Egito — a ambos foram concedidos passes por Alfonso V, o magnânimo da Espanha, em 1425. O conde Tomas pôde ainda produzir. Ele, em 1535, cruzou a fronteira pelo Somport Pass.
  • Counts Thomas e Martin — deram entretenimento em Castla em 1462, ao Chanceler. Eles também divertiram conde Jacobo, sua esposa Luísa e o duque Paulo. Eles foram também registrados em Múrcia.
  • Count Fhellipo — foi-lhe concedido salvo-conduto por Fernando e Isabel de Castela.

 

Grécia

  • Johannes Cinganus — recuperou sua posição de drungarius (comandante) de um grupo de soldados em Nauplion, Grécia, em 1444. Foi, então, para uma colônia de Veneza.
  • Michael de Hugot — foi dada uma feitoria de ciganos em Corfu, em 1470, pelo Conselho Veneziano.

 

Itália

  • Count Michele do Egito — morto por outro cigano, Felipe, em Fermi, em 1457.
  • Count Miguel do Egito e count Johannes — foi-lhes concedido salvos-condutos, em Capri, em 1470 e 1485, respectivamente.
  • Count Martino do Pequeno Egito — recebeu o mesmo favor pelo duque de Milão, em 1480.
  • Scaramuccia — este rei dos ciganos é possivelmente modelo de “Grotesque Head”, esboço de fisionomia humana, de Leonardo da Vinci, datado de 1503-07.

 

Romênia

  • Iulian Radulescu [Rudulescu] — coroado “imperador” dos ciganos em 1992, o que o pôs em conflito com Ion Cioba que reivindicava ser “rei” dos ciganos. Eles se tornaram reis e foram à mesma cidade Sibiu. Suas alegações foram ignoradas pela União Romani. Depois disto os líderes ciganos [da UR] optaram por títulos menos grandiosos. Rudulesco queria fazer greve de fome em 1995, em protesto contra o governo por ter chamado todos os Roma como “Tigan”, para evitar confusão entre romani e romenos. Em 1997, declarou o Estado simbólico dos ciganos “Cem Romengo” no distrito de Tirgu-Jiu. Cioba, veio de clã Kalderash, bem conhecido por trabalho em metalurgia.
  • Florin Cioba — adquiriu o título de “Rei cigano, no mundo inteiro”, em 1997, de seu pai Ioan Cioba, que tinha autoproclamado rei em 1992.
  • Bulibasha Ioan Munteanu — foi outro auto-intitulado rei dos ciganos e que foi muito desfavoravelmente registrado pela imprensa.

 

Hungria

  • Ladislaus — nomeado voivode dos ciganos por carta de Sigismundo, em 1423, dando salvo-conduto para seu grupo.
  • Tomas Polgar — nomeado voivode “do povo do Faraó”.
  • Lord Emaus de Egito — foi registrado como líder de 120 roma que chegaram em Brasso/Brasov, em 1516.

 

Polônia

Embora os roma fossem perseguidos e banidos no século dezesseis o governo mudou a política em 1607. Entre 1624 e 1652, o governo polonês reconheceu reis dos ciganos para ajudar na cobrança de impostos.

 

  • Matiasz Korolewicz — foi-lhe conferido o título de rei dos ciganos pela chancelaria da polícia real, em 1652, depois da morte de Janczy que tinha servido previamente como chefe dos roma. Mais tarde, reis dos ciganos parecem ter sido indicados pela aristocracia.
  • Michael Kwiek II — sucedeu seu pai Gregory Kwiek como rei dos ciganos, na Polônia em 1930, e foi também reconhecido como tal pelo governo polonês.
  • Janusz Kwiek — coroado como Janos I, rei dos ciganos, diante milhares de seu povo, em 1937.

 

Bulgária

  • Shibilis — o rei cigano é associado com poderes míticos, sendo capaz de dividir as águas ao meio pela espada.

 

Estados Unidos da América

  • Emil Mitchell — dizem que nasceu em 1857, no Rio de Janeiro, Brasil e morreu em uma tenda em Albertville. Alabama, em 1942. Tornou-se rei dos ciganos em 1884, em colorida bebedeira em uma cerimônia em Cleveland, Ohio.
  • Kelly Mitchell — a primeira esposa de Emil (e rainha), nasceu em 1868, morreu em 1915, após um parto prematuro. Teve 15 filhos. Seu enterro teve o comparecimento de 20000 pessoas do seu povo.
  • Flora Mitchell — irmã de Emil, tornou-se rainha, seguindo-se sua morte. Ela morreu em Yazoo city em 1930.
  • M.H. Frank — viveu em Meridian, foi escolhido para rei após a morte de Emil.
  • Johnny Nikanov — um cigano russo-americano. Descrito por Joseph Mitchell como rei dos ciganos, em um ensaio de sua coleção Up in the old hotel.

 

Pedimos vênia para transcrever pequeno trecho da biografia do aventureiro inglês, Sir Richard Francis Burton (1821-1890), diplomata, explorador, erudito, militar escritor, tradutor, poliglota (falava 29 idiomas e outros dialetos inclusive o romani). Ele viajou o mundo inteiro. A biografia é de autoria de sua esposa Isabel Burton e tem o título The life of captain Sir Richard F. Burton, publicada em 1893.

 

In the January number of the Gypsy Lore Journal a passage is quoted from ‘a short sketch of career’ of my husband (a little black pamphlet) which half suspects a remote drop of Gypsy blood in him [Burton]. There is no proof that this was ever the case; bur there is no question  that he showed many of their peculiarities in appearance, disposition, and speech—speaking Romany like themselves. Nor did we ever enter a Gypsy camp without their claiming him: “What are doing with a black coat on? they would say; why don’t you join us and be our King?”[1]

 

Tradução livre:

 

Numa passagem no número de janeiro do jornal Gypsy Lore está registrada ‘um esboço da carreira’ de meu marido (um pequeno encarte), o qual levanta ligeira suspeita de que o sangue de Burton era mestiçado com cigano. Não há prova alguma deste caso, mas não há questionamento de que ele mostrava muitas peculiaridades na aparência, comportamento e modo de falar, pois conversava em romani como eles. Nunca entramos num acampamento cigano sem que apelassem: “O que faz com este casaco negro?” Eles diriam: “Por que não se juntar a nós e ser nosso rei?”

 

Aqui damos por terminada a síntese que fizemos dos reis e realeza cigana, publicada na Wikipedia bem como em outros livros. Simplificamos aqui, porque em nosso primeiro ensaio: Reis ciganos, ver site <ciganosbrasil.com> demos muitos outros detalhes e a repetição estava se tornando enfadonha.

 

Argumentamos que para ser “rei” não é essencial ter território delimitado. O Papa é “rei” espiritual de milhões de católicos, no mundo inteiro. Mora no Vaticano, que se compõe de alguns edifícios, igrejas, bibliotecas etc., tem 0,44km2 e mil habitantes. Por que não admitir um rei cigano, exercendo liderança sobre todos aqueles que se consideram ciganos e se disponham a obedecê-lo? Lembramos novamente que a decisão é sua, caro leitor, cara leitora; exerça seu livre-arbítrio e decida se existem ou existiram reis ciganos. Mas, na sua análise, deixe na ante-sala pensamentos de rancor, deboche, desprezo, má-vontade, arrogância, preconceito e se torne pleno de amor, de luz, compreensão, solidariedade e respeito. Seja tolerante, assim tudo será mais fácil.

 

Encontrei na internet http://www.gypsypalace.co.uk/history.html Uma breve história do palácio cigano, que diz em tradução livre o seguinte: “Não sabemos ainda exatamente quando o palácio cigano foi construído, parece-nos seguro que foi usado como residência cigana no século XVII. Entretanto, sabemos que a Rainha Esther Faa Blithe e, talvez, entre todos, o mais famoso monarca cigano pernoitou no palácio cigano em 16 de novembro, de 1861. Em agosto de 1866, ele foi visitado por George Borrow, escritor e sábio, esperto em romani, e o palácio foi descrito como simples sobrado, caiado, coberto com telhado de sapé; uma casa de campo, com paredes recobertas de era. O único quarto era mantido asseado, arrumado e bem mobiliado, com duas camas, nos cantos, em cada lado da lareira. Duas arcas para roupas, um relógio de parede, quadros e um gato. Visitantes ─ que veem de todas as partes do mundo para visitar a rainha Esther ─ também dizem ter visto duas enormes espadas penduradas no teto. Uma delas foi usada em cerimonial cigano, e a rainha Esther explica que a outra foi tomada como suvenir na batalha de Flodden em 1513. [....]. O filho da rainha Esther, Charles Faa Blythe, continuou a morar no palácio durante 15 anos antes de sua coração, como novo rei cigano. A coração teve lugar em 30 de maio de 1898 e foi um grande evento, com mais de 10000 pessoas descendentes de Kirk Yetholm. King Charles II, como foi conhecido, continuou a viver no palácio cigano até a sua morte quatro anos depois”.

 

FINIS



[1] Apud Richard F. Burton, in The Jew, the Gypsy and El Islam (1898), p. XIII e XIV.

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