Geraldo Tomaz nasceu em 24 de maio de 1926, em Juiz de
Fora, em uma pequena casa nas imediações da antiga
“Parada Pecuária” (na entrada para o atual bairro
Barbosa Lage). Filho do lavrador de origem italiana
Corintho Tomaz de Aquino e de Maria José Tomaz. Foi o
terceiro dos quatro filhos do casal. Os demais irmãos
eram Maria (a “Neném”), Belarminda (a “Belinha”) e
Francisco.
Sua infância foi marcada por enormes dificuldades. Aos 7
anos trabalhava com o pai no lugar conhecido como
Calundu (onde existe hoje o bairro Parque das Torres).
Além do ofício de lenhador, seu pai cuidava da lavoura
de arroz, milho, feijão e batata. No lugar, existiam
duas casas: a da família e a do italiano Pedro Menon.
Ali trabalhou até completar 11 anos, quando perdeu o
pai, vitimado por uma água contaminada que bebeu próximo
à atual barragem João Penido. Na ocasião, Corintho
contraiu um mal conhecido como “febre dos macacos”,
vindo a morrer em 11 de março de 1937.
Uma curiosa lembrança Geraldo procurou preservar: em
outubro de 1930, no auge da eclosão da revolução que
levou Getúlio Vargas ao poder, seus pais – assustados
com o movimento de tropas e tiros nas imediações –
fugiram de casa de madrugada atravessando o Rio
Paraibuna em uma canoa com os quatro filhos pequenos. O
caçula, Francisco, havia nascido naquela semana. A
família foi buscar abrigo na fazenda do Coronel Vidal.
Este episódio lhe foi passado muitas vezes pela mãe.
Geraldo estudou pouco, mas a vida o ensinou muito. As
oportunidades eram remotas, pois precisava trabalhar
cedo. As primeiras letras aprendeu em uma escola que
existia nas proximidades da fazenda da Remonta do Monte
Belo. Ensino bem aplicado. Durante toda a vida, Geraldo
apresentou uma leitura irretocável e o cuidado extremo
com a gramática, seja escrevendo ou falando em público.
Com a morte do pai, a mãe Maria José assumia a grande
responsabilidade de criar os quatro filhos menores. Seus
avós maternos, Gabriel Marques e Maria Luiza Marques,
passaram a ter maior presença na formação dos netos.
Gabriel era lavrador. Administrava a fazenda Quinta da
Lage, do Coronel Manoel Vidal Barbosa Lage, de
tradicional família, respeitado pecuarista e chefe
político em Juiz de Fora. Morreu em 1962.
Homem de trabalho
Em 1938, aos 12 anos, foi trabalhar em uma tamancaria no
bairro Jóquei Clube, do português João Nunes. Com
Geraldo, também trabalhava sua irmã Belarminda. Em 1940,
aos 14, trabalhou como retireiro em um grande curral que
havia onde existe hoje o bairro Jóquei Clube II, e que
pertencia ao português Domingos Luiz.
Em 1944, Geraldo viveu uma de suas maiores frustrações:
desejando seguir a carreira militar, alistou-se para o
exército brasileiro. Imaginava, com isso, partir com os
pracinhas para os campos de batalha na Itália durante a
II Guerra Mundial. Então veio a notícia-bomba: sua ficha
foi recusada. Consideraram o jovem desnutrido e sem peso
suficiente para participar da tropa. Vida que segue.
Em 1945, adquire sua carteira de trabalho que pela
primeira vez é assinada. No mesmo ano – em 1º de março -
passou a trabalhar na Cerâmica Juiz de Fora, que
funcionava na Rua Olavo Bilac, no bairro Cerâmica. Ali,
fabricava tijolos e manilhas, trabalhando de segunda a
sábado. Na cerâmica ficou até 3 de abril de 1946.
Em Juiz de Fora a vida estava difícil e Geraldo foi
tentar o mercado de trabalho do Rio de Janeiro. Na
capital carioca, em outubro de 1947, no bairro de
Engenho de Dentro, abria valas na rua para colocação de
encanamento d’água. Durante um ano, ele trabalhou como
servente para a Companhia Construtora Koteca. Ainda no
Rio, no município de São João de Meriti, em 1949,
trabalhou na fábrica de tamancos de Olívio Gouvêa. Tempo
duro: de segunda a sábado, das 6 da manhã às 10 da
noite, produzindo tamanco de embaúba. Batendo pregos com
o tamanco apoiado na perna. Ali ficou um ano. Em Meriti,
residiu em um cômodo da Rua Dona Emília. Durante seis
meses, trabalhou em um bar da Rua da Matriz.
Seus primeiros anos no Rio reservaram-lhe um triste
golpe: sua mãe ficara doente em Juiz de Fora. Quando a
notícia chegou – com grande atraso - até Geraldo, ele
retornou à cidade natal. Era tarde. A mãe havia falecido
em 30 de março de 1949, e já estava sepultada.
De 1950 a 1952, a vida tomava novo rumo. O português
Alfredo, abriu-lhe as portas do Restaurante Estoril, na
mesma Rua da Matriz. Ali aprendeu a cozinhar. Depois do
Estoril, passou seis meses em outro restaurante: o
Caramurrai, de Manoel Rangel.
Em março de 1952, retornava a Juiz de Fora. Durante dois
anos, fez bicos e ajudou o tio Belarmindo, o Tito, em
seu bar no Jóquei Clube. Nessa época, fez curso para
telegrafista dos Correios. Embora aprendesse o ofício,
nele não chegou a trabalhar.
Maio de 1954: novo e definitivo emprego. Geraldo foi
aprovado em uma seleção e passou a ser servidor federal.
Passava a trabalhar na Fábrica de Estojos e Espoletas de
Artilharia do Exército: a FEEA, em Benfica. Foi
cozinheiro no rancho dos funcionários e no cassino dos
oficiais.
Um cozinheiro de mão cheia! Preparava grandes e
sofisticados banquetes. Às vezes, era acordado de
madrugada em casa para preparar a refeição de alguma
inesperada visita em residência de algum diretor da
fábrica. Houve uma ocasião em que teve de aprender às
pressas a fazer pratos árabes, a fim de atender uma
delegação de oficiais e empresários do Iraque em visita
à FEEA.
Na FEEA ficou até aposentar-se em janeiro de 1982.
Convidado, voltou a trabalhar no mesmo ano e no mesmo
lugar, agora chamado de Indústria de Materiais Bélicos
do Brasil – Imbel (que substituiu a FEEA). Ali ficou até
1987, ao completar 61 anos de idade.
Homem de família
O ano de 1953 foi especial. Quando trabalhava em um bar
no bairro Francisco Bernardino, Geraldo começou a
perceber uma grata e periódica presença. Tratava-se de
uma moça de 20 anos, moradora do lugar. Era Honorinda
Dornelas de Souza, a “Nainha”.
Tecelã, Honorinda trabalhava na Companhia Industrial
Mineira, na Avenida dos Andradas. De família grande –
eram 13 irmãos, a moça despertou sua atenção e o desejo
de conversar. Os olhos azuis e o perfil galanteador
marcaram as investidas do rapaz. Seus pais, o lavrador
Manoel de Souza Filho e a dona de casa Maria José de
Assunção, aprovaram a relação. O moço era sério,
trabalhador e tinha boas intenções.
Honorinda nasceu em 06 de janeiro de 1933, em Tabuleiro
do Pomba (atual município de Tabuleiro/MG), então
distrito de Rio Pomba/MG.
Do namoro, passando pelo noivado, até o casamento foram
dois anos. Em 15 de janeiro de 1955, na Igreja de N.S.
Lourdes, do bairro Francisco Bernardino (a antiga
Creosotagem), finalmente se casaram. Nainha agora era a
senhora Honorinda Dornelas Tomaz.
O casamento deu a Geraldo e Honorinda seis filhos:
Janete (nascida em 26 de julho de 1956), Wiliam (nascido
em 6 de dezembro de 1957), Elizabete (nascida em 18 de
dezembro de 1960), José Maria (nascido em 26 de janeiro
de 1962), Vanderlei (nascido em 29 de julho de 1964) e
José Ronaldo (nascido em 6 de outubro de 1965). Todos os
filhos nasceram na antiga Maternidade da FEEA ou na
própria residência, com o auxílio das parteiras Dona
Joana e Dona Penha.
Vida difícil. A família era grande e o salário
irrisório. Geraldo completava o orçamento da casa
vendendo roupas, salgados que fazia com a mulher,
confeitando bolos para festas, e comercializando carros
velhos e bicicletas. No seu portão, sempre havia
encostado um Gordini, Aero Willys, DKW Vemag, Belcar,
Variant, Brasília, entre outros carros de fácil negócio.
Comprava o carro barato, consertava e revendia. Se não
desse conserto, desmontava sozinho e as peças eram
vendidas. Assim, os anos se passaram, os filhos
cresceram e foram educados. Honorinda, a sua querida e
inseparável Nainha, foi seu principal apoio durante todo
o tempo.
Desde os primeiros anos do casamento morou em
residências da FEEA: em casas dos conjuntos do extinto
Ipase e em uma moradia que existia na antiga Parada
Felício Lima (a “paradinha da FEEA”). Somente depois da
aposentadoria conseguiu sua casa própria: um apartamento
na Rua Marilia, em Benfica.
Aos filhos, somaram-se genro e noras que deram a Geraldo
e Honorinda os netos: Priscila (falecida
prematuramente), Corinto, Gustavo, Daniel, Felipe,
Fernanda, Layla e Mariana.
Homem de fé e homem de bem
No trabalho, Geraldo era carinhosamente conhecido como
“irmão” ou “maninho”. Talvez por sua crença ou mesmo
pela amizade sincera que oferecia.
Religioso, pastor da Igreja Evangélica Assembléia de
Deus (tendo concluído Curso de Bacharel em Teologia pelo
Instituto Bíblico Ebenézer do Rio de Janeiro), Geraldo
aplicou em todo o tempo as lições cristãs de
solidariedade, fraternidade, fé, esperança, bondade,
justiça e respeito. Sua conversão e batismo aconteceram
em 1965.
Assistia aos mais necessitados que o procuravam como se
fossem membros da própria família. Muitas vezes, era
acordado à noite e saía apressado para aplicar uma
injeção, levar um medicamento ou uma cesta de alimentos
a alguma pessoa aflita. Nunca permitiu que um faminto em
sua porta de lá saísse sem ser assistido. Houve ocasiões
em que atuou como instrumento transformador de
desamparados que bateram em sua casa. Pessoas que
chegaram lá como mendigos, abandonados pela família,
tiveram sua assistência: banho, alimento, vestuário,
auxílio médico, regularização de documentos pessoais,
orientação espiritual e teto. Homem de oração e
otimismo, sempre teve a Bíblia como instrumento de
propagação das boas novas. Geraldo sempre ensinava: “Se
desejar dar uma cesta de alimentos a uma pessoa, leve
até a casa dela, e entregue em um horário em que o
vizinho não possa ver. Quando alguém pede uma comida,
ele chegou no limite da necessidade e da humilhação. Não
é correto querer aparecer como homem generoso em um
momento da miséria humana. Jesus ensinou sobre a mão
direita não saber o que a esquerda está fazendo.”
O pouco estudo não lhe tirou o prazer da leitura. Lia
muito. Memorizava longos textos e passagens bíblicas.
Gostava de ler os jornais do dia e não perdia os
programas de jornalismo e documentários da televisão.
Como evangelizador, foi responsável pela abertura de
pontos de pregação do Evangelho de Cristo – no final dos
anos 1960 e durante os anos 1970 - em diversos bairros
de Juiz de Fora e, em especial, da zona rural da cidade.
Valadares, Rosário, Penido, Igrejinha, Paula Lima, Dias
Tavares, Palmital, Toledos, Chapéu D’Uvas, dentre
outros, recebiam sempre suas visitas, ora chegando a pé,
ora de bicicleta, carro ou no ônibus da linha. Orava nas
residências pelas pessoas enfermas, distribuía folhetos
com mensagens evangelísticas e pregava nas praças
públicas. Como pastor responsável, construiu templos em
Benfica, Vila Esperança, Valadares e em outros bairros
de Juiz de Fora.
Geraldo Tomaz faleceu em 21 de dezembro de 2011, aos 85
anos. |